O aborto recorrente afeta 1 em cada 100 casais tentando ter um bebê e as anomalias cromossômicas podem ser a causa de aproximadamente 50% dos abortos espontâneos recorrentes. Em artigo publicado na revista científica International Journal of Obstetrics & Gynaecology, pesquisadores da Igenomix Espanha realizaram o estudo não invasivo de causas de aborto que detecta o DNA fetal no sangue materno para avaliar alterações cromossômicas. A análise não invasiva (niPOC) se mostrou efetiva e não inferior ao POC – e superior à análise de cariótipo – em determinar a causa genética do aborto clínico
No estudo recém publicado na revista científica BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology, intitulado “Non-invasive cell-free DNA-based approach for the diagnosis of clinical miscarriage: A retrospective study”, pesquisadores da Igenomix Espanha analisaram, em coorte retrospectiva, 120 mulheres com perda gestacional entre 2021 e 2022, com amostras coletadas em 24 centros colaboradores, como hospitais e laboratórios de análises genéticas. O objetivo foi avaliar a eficácia do teste de DNA celular livre (cfDNA) como uma abordagem não invasiva para detectar aneuploidias em abortos clínicos. A análise das perdas gestacionais possibilita identificar, por exemplo, se há uma base genética que levou ao aborto e, com isso, avaliar o risco de perdas fetais futuras.
No estudo, os autores compararam de forma pareada os resultados dos testes genéticos de produto de concepção por análise não invasiva (niPOC), a partir do sangue materno com estudo do cfDNA, com análise invasiva do produto de concepção (POC). Como resultado, não encontraram diferenças significativas entre os métodos invasivos e a análise não invasiva (10,0% [10/120] versus 16,7% [20/120], respectivamente). Os 20 casos não informativos no niPOC foi ocasionado por degradação do cfDNA sugerindo não correspondência da idade gestacional com a parada fetal. Também foi apontada que, das 120 amostras, 90 forneceram um resultado informativo nos grupos POC e niPOC (75%). A análise de cfDNA identificou corretamente as alterações cromossômicas em 85,1% (74/87) dos casos comparado a análise invasiva (excluindo as triploidias). A análise estatística binominal utilizada para determinar a concordância entre os métodos, identificou poucos casos discordantes (14,9% [13/87]) sendo todos do sexo feminino com baixa fração de cfDNA, sugerindo que o sexo fetal foi a única variável que influência a concordância entre os diferentes testes. A análise baseada no cromossomo Y permitiu a reclassificação ideal de cfDNA de fetos masculinos não informativos e uma avaliação precisa do desempenho do teste. Apesar de algumas limitações observadas a sensibilidade e especificidade do niPOC foram de 79,4% e 100%, respectivamente, que favorece o estudo citogenético por essa metodologia”, comenta Amanda Shinzato, bióloga e geneticista da Igenomix Brasil.
No artigo, também foi ressaltado a importância de coletar amostras de plasma materno antes do material expelido. No entanto, a maioria dos centros colaboradores não registrou essa informação no formulário de requisição de exame. Miguel Milán, Diretor de Diagnóstico Genético Pré-Natal, da Igenomix Espanha, em Valência, afirma que “os resultados do estudo permitiram avaliar a concordância do teste POC não invasivo com o invasivo para seu lançamento na Europa e Oriente Médio. Como próximos passos, outros países com laboratório Igenomix, entre eles o Brasil, estão se preparando para oferecer esta análise”.
Como são feitos os testes para perda fetal – Atualmente, a técnica convencional para estudar o material expelido durante uma perda fetal é o exame de cariótipo (citogenético), que identifica e avalia o tamanho, a estrutura e o número de cromossomos em uma amostra de células do corpo. Esse método requer células vivas para o cultivo celular, portanto, em até 40% dos casos não é possível a obtenção de resultado devido à baixa qualidade da amostra além da contaminação materna ser outro fator que impacta negativamente. Mas existem outros testes mais assertivos. Um deles é o POC (exame molecular), conferindo um processo mais rápido em comparação ao cariótipo de aborto convencional e com resultados obtidos em 99% dos casos.
O exame POC já é utilizado em muitos laboratórios, porém nesse estudo os pesquisadores utilizam um novo teste chamado de Teste de DNA livre de células para análise POC não invasiva (niPOC). Ele detecta o DNA fetal no sangue materno para avaliar alterações cromossômicas e, apesar das semelhanças, ainda não substitui o exame POC. Por sua vez, os dois são superiores ao exame de cariótipo porque trazem com mais precisão as amostras e são mais rápidos em relação ao cariótipo, que pode levar 30 dias para sair o resultado. O niPOC ainda não está disponível em nenhum serviço no país. O teste POC é oferecido na Igenomix Brasil.
Por que analisar tecido fetal após um aborto espontâneo – A importância da investigação do material biológico após a curetagem permite conhecer a possível base genética na perda da gravidez e controlar o risco de perdas fetais futuras. A análise dos fetos permite saber se a causa do aborto foi genética. Aproximadamente metade dos abortos espontâneos são devidos a alterações cromossômicas. As demais causas conhecidas são malformações uterinas, trombofilias, alterações imunológicas e infecções. A literatura médica recomenda que a investigação seja realizada a partir de duas ou mais perdas.
Referência do estudo
Balaguer N, Rodrigo L, Mateu-Brull E, Campos-Galindo I, Castellón JA, Al-Asmar N, Rubio C, Milán M. Non-invasive cell-free DNA-based approach for the diagnosis of clinical miscarriage: A retrospective study. BJOG. 2023 Aug 2. doi: 10.1111/1471-0528.17629. Disponível em https://obgyn.onlinelibrary.