A mulher tem adiado a primeira gestação e o fator mais importante, com prognóstico, é compreender se ela vai ter um bebê ou não em idade materna

Por Viviã de Sousa @revistaevolution

Com 60 anos de trajetória, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) trabalha para promover o fortalecimento e a valorização da categoria. Sua atuação tem possibilitado a educação e a capacitação de estudantes e profissionais de Ginecologia e Obstetrícia e, com isso, impactado diretamente o cuidado com a saúde das mulheres em suas rotinas de prevenção e tratamentos.

Entre tantas ações realizadas pela instituição, merece destaque a reestruturação e a modernização das provas para o Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia (Tego) e a elaboração de 120 protocolos de atendimento que visam uniformizar condutas e procedimentos de ginecologistas e obstetras, com base em evidências científicas e melhores práticas.

Sempre preocupada em dialogar com a mulher, a Federação lançou um portal, chamado “ELA”, que apresenta uma proposta inovadora com foco na saúde da mulher brasileira e apresenta conteúdos destinados à promoção dos cuidados com a saúde feminina.

A Revista EVOLUTION conversou com o Dr. Agnaldo Lopes da Silva Filho, médico ginecologista, obstetra e mastologista que preside a Febrasgo. Ele identificou, ao longo de sua experiência na área, a falta de associação da posição da mulher na sociedade atual e a questão da sua fisiologia. “A mulher tem adiado a primeira gestação e o fator mais importante, com prognóstico, é compreender se ela vai ter um bebê ou não em idade materna. […] Com o tempo, elas vão perdendo a sua capacidade reprodutiva”. Confira a entrevista completa a seguir.

EVOLUTION – Como foi a sua jornada profissional até assumir a presidência da Febrasgo?

Agnaldo Lopes da Silva Filho – Me formei em medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e fiz residência em cirurgia geral. Não pensava em fazer ginecologia. Me encantei pela cirurgia geral e fiz UR3 em cirurgia de trauma. Depois, por influência de professores e por me identificar com a área acadêmica, acabei me tornando professor e me encantei pela ginecologia e obstetrícia. Fiz outra residência médica e, hoje, atuo muito especificamente na cirurgia pélvica feminina, fazendo a parte da cirurgia minimamente invasiva, cirurgias vaginais, cirurgia laparoscópica e cirurgias robóticas. Atuo também com ginecologia oncológica e trato algo muito importante para as mulheres com infertilidade, que é a endometriose. Faço parte de um grupo multidisciplinar que atua nas cirurgias mais complexas da endometriose. Sempre tive uma relação e uma atuação muito efetivas com a universidade; sou professor titular do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da UFMG. Fui presidente da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig) e, em 2020, assumi a presidência da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Acredito em nossa classe profissional e em nosso compromisso na promoção da saúde para podermos ajudar as mulheres que querem engravidar e no tratamento das que possuem dificuldade em engravidar.

EVOLUTION – Quais são os principais desafios enfrentados pelos profissionais que atuam no segmento e quais perspectivas o senhor considera para promover o desenvolvimento do setor?

Agnaldo Lopes da Silva Filho – Atualmente, a Febrasgo possui 16 mil associados. É muita gente! Reconheço a força que uma categoria unida possui, pois representamos mais de 30 mil médicos brasileiros que atuam em ginecologia e obstetrícia no país. O que mais gosto de falar é que a gente tem uma responsabilidade por, pelo menos, 110 milhões de brasileiros. Então, acredito que a Febrasgo tem a missão de ser a voz da mulher brasileira.  Desenvolvemos um projeto muito interessante, que é o “ELA”, uma revista da instituição que tem o objetivo de promover informação para a promoção do cuidado com a saúde da mulher. A nossa pretensão é que sejamos, certamente, a voz da mulher brasileira. Todo o conteúdo é destinado a elas, pela importância que a gente dá para essa questão. A saúde da mulher é muito complexa, desde a questão da ginecologia e obstetrícia, que são duas especialidades muito especiais, até a saúde em geral da mulher, em todos os momentos da sua vida: infantopuberal, fase reprodutiva, pós-menopausa. São vários os desafios em cada etapa da vida. Um dos maiores é a questão da infertilidade. Sabemos que uma grande quantidade de casais é considerada infértil e tem dificuldade em realizar seu grande sonho de ter um bebê. Além da mudança do nosso padrão de sociedade (hoje também temos a questão de casais homoafetivos), a homofertilidade, a questão de mulheres ou mesmo homens que realizam tratamento oncológico, tudo isso pode afetar a fertilidade. Considero que é uma longa cadeia de valores, mas a atuação da reprodução humana e de especialistas em fertilidade é crucial. E mesmo nós, ginecologistas e obstetras não especialistas, temos um papel muito importante na trajetória desses casais que querem realizar o sonho de ter um bebê.

EVOLUTION – Quais são as queixas mais comuns sobre a reprodução que as mulheres levam para os consultórios? 

Agnaldo Lopes da Silva Filho – A mulher tem adiado a primeira gestação e o fator mais importante, com prognóstico, é compreender se ela vai ter um bebê ou não em idade materna. Percebemos a falta de associação da posição da mulher na sociedade atual e a questão da sua fisiologia. Com o tempo, elas vão perdendo a sua capacidade reprodutiva. Uma mulher, depois dos 35 anos, provavelmente vai ter mais dificuldade em engravidar. Se um casal tem relação sexual desprotegida e quer engravidar, após mais de um ano de tentativas, já vale a pena fazer uma propedêutica e mais alguns exames para definir o que realmente está dificultando que engravidem. Quanto mais precoce for a gestação, maiores são as taxas de gravidez. Outro ponto é a possibilidade da adequação ao momento atual da mulher. Ela pode optar pela criopreservação de óvulos, pelo congelamento dos óvulos. É o caso, por exemplo, da mulher que, aos 34, 35 anos, não tem perspectiva de engravidar no curto prazo. Por isso, é preciso discutir com o profissional especialista em fertilidade sobre a possibilidade de se fazer a criopreservação, de congelar os óvulos, preservando o futuro reprodutivo dessas mulheres.

EVOLUTION – Qual a preocupação da Febrasgo com os riscos no caso de profissionais que não possuem as devidas especialização e preparação para atuar na área da reprodução humana?

Agnaldo Lopes da Silva Filho – Nós temos o Título de Especialista em Reprodução Humana. Ele é feito pela MB com a Febrasgo. Temos um cuidado muito grande com esse título, pois nos preocupamos em formar e dar a titulação aos profissionais efetivamente capacitados para atender as mulheres, com atenção à formação R4 de reprodução humana. A Federação participa da Comissão Nacional de Reprodução Humana e da Comissão Nacional de Residência Médica; então, o 4° ano de residência médica, para nós, é uma questão da matriz de competência. Contudo, também há uma preocupação com os ginecologistas e os obstetras que não são especialistas. Precisamos da compreensão da classe para a formação desses profissionais no que se refere à reprodução humana. No dia a dia, a gente sabe que existe um grande atraso na jornada de uma paciente infértil, e tempo é algo valioso para esses casais. Qualquer atraso, demora no atendimento, demora no encaminhamento para o profissional adequado, pode significar a chance de uma mulher ter ou não um bebê.

EVOLUTION – Nesses 60 anos da Febrasgo, quais foram os principais marcos da instituição no setor?

Agnaldo Lopes da Silva Filho – A Febrasgo tem muito o que comemorar; é uma instituição representativa e que atua em todo o país. Ela possui uma capilaridade muito grande, atinge colegas ginecologistas e obstetras em todo o Brasil e tem um papel importante na formação e na certificação de novos profissionais na área. Com 60 anos de trajetória, temos muitas histórias para contar e me sinto honrado em fazer parte de tudo isso. Também fico muito satisfeito por todo o trabalho realizado pelas gestões anteriores, que tornaram a nossa instituição uma referência e uma entidade que tem muita credibilidade não só com os profissionais da saúde, mas, também, com toda a população em geral. Nós temos uma política: estar ao lado da mulher brasileira e oferecer qualidade em assistência à saúde, proporcionando um atendimento cada vez melhor em todo o país. Esse é um desafio muito grande, pois somos um país continental e com 220 milhões de habitantes, mas a Febrasgo vai sempre levar a bandeira da mulher brasileira.

EVOLUTION – Qual o potencial e quais são os desafios do mercado da reprodução humana? 

Agnaldo Lopes da Silva Filho – É um mercado que ainda vai crescer bastante. O número de ciclos de fertilização in vitro, no Brasil, ou teste de alta complexidade, é muito menor. Nos outros países, as mulheres conseguem ter acesso a técnicas complexas de reprodução assistida, enquanto a gente esbarra justamente nessa questão. Sabemos do custo dessas técnicas e da limitação de acesso a elas em clínicas de reprodução assistida. Grande parte da população do Sistema Único de Saúde (SUS) tem desafios muito importantes no Brasil. De um lado, temos a população, e, do outro, a capacitação de profissionais de saúde para atuarem nessa área. Há uma luta gigante para a população conseguir acesso às técnicas, e isso tem uma grande importância para ajudar na realização do sonho dos casais de terem filhos.

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