Possibilidades de trabalho do psicólogo especialista em RHA

Tem-se uma Reprodução Humana medicamente assistida, mas é preciso falar de uma Reprodução Humana médica e emocionalmente assistida, o que justifica a busca do psicólogo em se especializar na área, tamanha a responsabilidade e a contribuição do seu trabalho para o bem-estar do paciente durante sua jornada reprodutiva.  


A Reprodução Assistida é uma especialidade da Medicina empenhada em viabilizar a gestação para pacientes que desejam ter seus filhos, mas encontraram alguma(s) dificuldade(s) após as tentativas espontâneas. São tratamentos que podem ser desgastantes do ponto de vista da saúde física, financeira e emocional. Sobre este último aspecto, a Psicologia apresenta-se como área do conhecimento capacitada a dar o suporte necessário para o sofrimento humano, em suas diversas ordens. 

A Psicologia em Reprodução Assistida é uma especialidade que procura atender às demandas dos pacientes antes, durante e depois dos seus tratamentos reprodutivos, pois geralmente podem ser vivenciados com angústias, incertezas e sentimentos conflitantes. Como toda especialidade, esta também proporciona ao profissional uma atuação mais condizente com a realidade e as demandas de determinado público-alvo, atendendo às suas especificidades. Além do mais, esta especialidade pode estar entre os critérios do paciente no momento da escolha de um profissional para cuidar da sua saúde mental durante sua jornada em busca do tão sonhado filho. 

É sob a chancela do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que se tem a possibilidade de pleitear, a partir da conclusão de cursos de pós-graduação e critérios específicos, o título de especialista clínico, por exemplo. Na área da Reprodução Humana Assistida, como reportado na edição anterior desta revista, o Brasil, desde 2019, conta com uma pós-graduação, com carga horária de 410 horas/aulas, que aborda diferentes aspectos biopsicossociais, éticos e legais envolvidos na temática da infertilidade e nos tratamentos reprodutivos, sejam eles de baixa, sejam de média ou de alta complexidade. A referida especialização nos capacita para a elaboração e a coordenação de livros, e-books, materiais de apoio, protocolos, revistas científicas, cursos, simpósios, eventos e congressos da área. 

Os psicólogos interessados nesta área estão, cada vez mais, engajados na produção científica e aprofundando seus conhecimentos para proporcionar uma intervenção adequada a este público específico. Trabalham para que a Psicologia possa ser reconhecida e valorizada como parte fundamental e integrante de todo processo (GIACON, 2022, p. 175).

Embora haja um consenso entre os profissionais da área sobre a importância do acompanhamento psicológico durante os tratamentos reprodutivos, algumas clínicas ainda não oferecem este serviço aos seus pacientes. Por outro lado, há que se reconhecer o notório empenho por parte dos profissionais da saúde mental para que todas as clínicas brasileiras possam introduzir o trabalho da Psicologia em suas equipes multidisciplinares. 

Inicialmente, destacamos algumas possibilidades de parcerias: o psicólogo que está vinculado a uma clínica de Reprodução Humana e desenvolve seu trabalho junto à equipe técnica e realiza os atendimentos com os pacientes; outra possibilidade é a parceria na qual ele recebe encaminhamentos feitos por outros profissionais da Reprodução Humana Assistida em sua clínica particular; e, por último, a opção de atender a demandas espontâneas de pacientes que o procuram por meio das redes sociais e indicações diversas.

Além da possibilidade do atendimento individual, de casal, grupos de apoio, o psicólogo especialista está habilitado para trabalhar com a equipe da clínica, pois esta, geralmente, é alvo de grande sobrecarga, ansiedade e estresse, muitas vezes suscitados com a aproximação da história de vida do paciente. O psicólogo lança um olhar cuidadoso sobre as relações interpessoais no sentido de promover um ambiente de trabalho mais integrado, otimizado e harmonioso entre os colaboradores daquele centro. 

Sabemos que a demanda é sempre do paciente, mas há que se considerar pertinente que ele possa ter acesso ao serviço da Psicologia, seja na própria clínica, seja recebendo um encaminhamento feito pelo médico e/ou equipe responsável. As possibilidades de atuações do psicólogo são muitas e podem ocorrer de forma presencial ou remota (on-line)

Foi por meio da Resolução no 11/2018 do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que psicólogos de todo país tiveram, em definitivo, regulamentadas suas práticas de atendimentos on-line, por meio das tecnologias da informação (CFP, 2018). Esta modalidade viabilizou e ampliou o acesso aos serviços psicológicos em diversas frentes. As redes sociais aproximaram profissionais e pacientes; psicólogos de diferentes regiões puderam se empenhar em um profícuo diálogo interdisciplinar e multidisciplinar. Este estreitamento das relações foi amplamente observado e se consolidou como uma tendência de relações de trabalho e profissionais. Dini, de Marchi e Steiger (2022) contam que, durante a pandemia de Covid-19, foi possível perceber um aumento de profissionais divulgando seus trabalhos nas redes por meio de eventos on-line, como lives, grupos de apoio e simpósios. As mesmas autoras também dizem que, no contexto da Reprodução Humana Assistida, o acompanhamento psicológico on-line vem se mostrando como possibilidade facilitadora do encontro do paciente com o profissional de sua preferência, mesmo que este more em outra cidade ou país.  

A partir disso, chamamos a atenção para outro eixo em que podemos trabalhar na área da Psicologia em Reprodução Humana Assistida: a pesquisa científica, principalmente no que diz respeito a como estão, do ponto de vista emocional, as famílias brasileiras advindas dos tratamentos reprodutivos. Pesquisas estas que já são realidade em outros países e que, por sua vez, exigem engajamento e investimento por parte dos profissionais brasileiros interessados em contribuir para o desenvolvimento científico e para a consolidação do trabalho da Psicologia na Reprodução Humana Assistida. 

A Psicologia está sempre disponível a um diálogo interdisciplinar em prol do bem-estar biopsicossocial de todos envolvidos. Estamos à frente de questões complexas e específicas para as quais somos demandados, como, por exemplo, no que prevê algumas Resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM), como nos casos de doação de gametas intrafamiliar e útero de substituição (CFM, 2022). Mas, para além de atender a estas demandas específicas, a Psicologia se apresenta como parte fundamental durante todo o processo, não somente nos casos conflitantes do ponto de vista emocional. Entre outras coisas, ampliamos a reflexão para que o paciente possa pensar nas possibilidades apresentadas pela Reprodução Humana Assistida, auxiliando-o na tomada de decisão de forma mais segura e consistente. 

Enfim, tem-se uma Reprodução Humana medicamente assistida, mas é preciso falar de uma Reprodução Humana médica e emocionalmente assistida, o que justifica, então, a busca do psicólogo em se especializar na área, tamanha a responsabilidade e a contribuição do seu trabalho para o bem-estar do paciente durante sua jornada reprodutiva.  

Referências 

BASSANI, M.; GIACON, F. A dura espera emocional dos pacientes na iniciativa pública: o papel da Psicologia na Reprodução Humana Assistida. In: BASSANI, M.; GIACON, F. (Orgs.). Reprodução Assistida: a relação entre Direito e Medicina. Teresina: Editora Império, 2022.

CFM – CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 2.320/2022. Brasília: CFM, 2022.

CFP – CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Resolução CFP n° 11/2018. Brasília: CFP, 2018.

DINI, A.; DE MARCHI, B.; STEIGER, K. Os pacientes e as redes sociais: a força virtual pela causa da infertilidade e dos tratamentos reprodutivos. In: GIACON, F. (Org.). Contribuições Interdisciplinares no Contexto da Reprodução Assistida. Brasília: Editora Viva +, 2022.

* Bruna Maria Schiavinatto é especialista em Psicologia da Reprodução Humana pelo Instituto Suassuna/GO, membro da SBRH e da SBRA.

** Flávia Giacon é especialista em Psicologia da Reprodução Humana pelo Instituto Suassuna/GO, psicóloga da Mater Prime – Clínica de Reprodução Humana, membro do Comitê de Psicologia da SBRH, membro da SBRA e Advisory Board da Revista EVOLUTION.

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